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segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019
Arte Cinética
O termo cinético está
etimologicamente ligado à idéia de movimento. Na tradição artística, é possível
localizá-lo, por exemplo, no Manifesto Realista de Antoine Pevsner
(1886-1962) e Naum Gabo (1890-1977), em escritos de László Moholy-Nagy
(1895-1946) e nas páginas da revista de arte argentina Madí (1946),
ainda que saibamos ser a preocupação com o movimento nas artes visuais muito
mais antiga, remontando, no limite, aos animais representados nas paredes de
Lascaux. Se isso é verdade, o termo é efetivamente incorporado ao vocabulário
artístico em 1955, por ocasião da exposição Le Mouvement [O Movimento], na
galeria parisiense Denise René, com obras de artistas de diferentes gerações:
Marcel Duchamp (1887-1968), Alexander Calder (1898-1976), Vasarely (1908),
Jesus Raphael Soto (1923) Yaacov Agam (1928), Jean Tinguely (1925), Pol Bury
(1922), entre outros. A especificidade da arte cinética, dizem os estudiosos, é
que nela o movimento constitui o princípio de estruturação. O cinetismo rompe
assim com a condição estática da pintura, apresentando a obra como um objeto móvel,
que não apenas traduz ou representa o movimento, mas está em movimento. É o
caso dos famosos móbiles de Calder, cujo movimento independe da posição e do
olhar do observador. Construídos com peças de metal pintadas, suspensas por
fios de arame, os móbiles movem-se ao sabor da aragem mais suave, produzindo
efeitos mutáveis em função da luz. Ao observador cabe contemplar o movimento
inscrito nas obras, "desenhos quadridimensionais", como quer Calder.
As máquinas e motores construídos por Tinguely (por exemplo, Homenagem a
Nova York: obra de arte que se autoconstrói e se autodestrói, 1960),
assim como as esculturas cibernéticas de Nicholas Schöffer (1912) - a primeira
data de 1956 - representam outros exemplos de trabalhos que implicam movimento
real.
Críticos como Frank Popper (Naissance
de l'Art Cinétique, 1967) tendem a alargar o sentido do termo abrigando em
seu interior conjuntos muito diversos de trabalhos: não apenas os que lidam com
o movimento real, mas também aqueles que implicam em movimento ótico. A partir
desse sentido ampliado, pode-se pensar na op art como parte da arte cinética. Afinal,
replica Victor Vasarely (1908), "o movimento ótico, ainda que ilusório,
não pertence por acaso ao cinetismo?" Além da Galeria Denise René, que
reúne um grupo de artistas envolvido com as investigações visuais da op art -
Julio Le Parc (1928), Luis Tomasello (1935), Carlos Cruz-Diez (1923) etc. -, o
Groupe de Recherche d'Art Visuel (GRAV) é outro pólo aglutinador da produção da
op art e da arte cinética, em Paris, entre 1960 e 1968. Nele se destaca o nome
do venezuelano Jesús-Raphael Soto. Entre 1950 e 1953, o artista cria obras em
que elementos dispostos em série no espaço produzem efeitos de movimento
virtual e vibração ótica (Estudo Para Uma Série, 1953). Mas é em 1955
que ele se lança mais diretamente em relação às pesquisas cinéticas,
fundamentadas nas alterações perceptivas decorrentes seja da posição do
observador diante da obra, seja do uso de elementos suspensos a vibrar diante
um fundo. Os nomes de Karl Gerstner (1930), Almir Mavignier (1925), Jeffrey Steele (1931), Gehrard
von Graevenitz (1934) e Larry Pons (1937) aparecem ligados à arte ótica e
cinética.
Alguns estudos, como o do crítico
inglês Guy Brett, ampliam ainda mais a noção de arte cinética, pensando-a como
ligada à "linguagem do movimento". Com isso incorporam a ela
trabalhos que evidenciam possibilidades de transformação, seja pela posição do
observador, seja pela manipulação da obra. Os relevos justapostos que compõem Meodia
(1957), de Agam, por exemplo, apresentam figuras distintas em função do
deslocamento do observador. A obra, diz o artista, não está acabada, mas é
gestada em cada momento. A idéia de metamorfose acompanha também os trabalhos
de Soto (Metamorfoses, 1954 e Modulação em Azul, 1965) e os de Le
Parc (Anteojos Para Una Visión Distinta, 1965). As ambiências
luminosas de Dan Flavin (1933), por sua vez, figuram entre as pesquisas com
movimento a partir do uso da luz fluorescente. Brett inclui o movimento ótico
dos relevos de Sérgio de Camargo (1930-1990), as
transformações dos bichos manipuláveis de Lygia Clark (1920-1988) e a "fragilidade
e energia" das droguinhas de Mira Schendel (1919-1988) como parte da arte
cinética, já que exemplares da "linguagem do movimento" tal como
utilizada na arte contemporânea.
Experiências com o cinetismo e o
movimento aproximam artistas e grupos em diversas partes do mundo, por exemplo,
na Itália (Grupo T, de Milão, 1959-1964 e Grupo N, de Pádua, 1960), na Alemanha
(Grupo Zero, 1958) e nos Estados Unidos, que têm na exposição The Responsive
Eye [O Olhar Interativo], MoMA/Nova York, 1965, um marco da arte ótica e
cinética. No Brasil, além dos nomes já mencionados, é possível pensar em alguns
artistas que realizaram experiências óticas em seus trabalhos: Lothar Charoux (1912-1987), Almir Mavignier, Ivan Serpa (1923-1973), Abraham Palatnik (1928), entre outros. Nos
anos 1950 algumas pinturas de Luiz Sacilotto (1924-2003) antecipam questões
que serão desenvolvidas posteriormente pela op art propriamente dita. Trabalhos
de Soto estiveram presentes na 7ª Bienal Internacional de São Paulo, 1963. Da
8ª Bienal, em 1965, participaram Vasarely e Tinguely. Mas é na 9ª Bienal, em
1967, que a arte cinética ganha destaque com a premiação de Julio Le Parc.
REFERÊNCIAS
BÉRTOLA, Elena de. El arte
cinetica, el movimiento y la transformación: análisis perceptivo y
funcional. Buenos Aires: Ediciones Nueva Visión, 1973, 218 pp., il.
p&b.
BRETT, Guy. Kinetic Art - the
language of movement. London/ New York: Studio-Vista/ Reinhold Book
Corporation, 1968, 95 pp. Il. p&b.
SCHÖFFER,
Nicolas. Nicolas Schöffer. Introduction de Jean Cassou.
Neuchatel: Éditions du Griffon, 1963, 149 pp. il. p&b. color.
VETTESE, Angela. Capire L'Arte
contemporanea, dal 1945 ad oggi. Milano: Umberto Allemandi & C. ,
1996, 327 pp. Il. p&b. color.
ARTE Cinética. In: ENCICLOPÉDIA
Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2019.
Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo353/arte-cinetica>.
Acesso em: 11 de Fev. 2019. Verbete da Enciclopédia.
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