A "arte da terra" inaugura uma nova relação com o ambiente natural, sendo muitas vezes designada como ramo da environment art [arte do ambiente]. Não mais paisagem a ser captada e representada, nem manancial de forças e instintos passível de expressão plástica, a natureza agora é o locus onde a arte finca raízes. Desertos, lagos, canyons, planícies e planaltos oferecem-se aos artistas que realizam intervenções sobre o espaço físico. Em Double Negative [Duplo Negativo], 1969, por exemplo, Michael Heizer abre grandes fendas no topo de duas mesetas do deserto de Nevada, Estados Unidos, com a remoção de 240 mil toneladas de terra. Um ano depois, Robert Smithson realiza Spiral Jetty [Píer ou Cais Espiral], gigantesco caracol de terra e pedras construído sobre o Great Salt Lake, em Utah, Estados Unidos. A partir de 1971, Walter de Maria concebe o que em 1977 recebe o nome de The Lightning Field [O Campo dos Raios]. Num imenso platô ao sul do Novo México, Estados Unidos emoldurado por montanhas ao fundo, o artista finca 400 pára-raios de aço inoxidável, espalhados em distância regular um do outro, cobrindo totalmente a área.
Nos três casos, o trabalho artístico dirige-se à natureza, transformando o entorno, com o qual se relaciona intimamente. As obras, de grandes dimensões, resistem à observação distanciada, a não ser por meio de fotografias e filmes. Para experimentá-las, é preciso que o sujeito se coloque dentro delas, percorrendo os caminhos e passagens que projetam. Ancorados num tempo e espaço precisos, os trabalhos rejeitam a sedução do observador ou as sugestões metafóricas. Põem ênfase na percepção, pensada como experiência ou atividade que ajuda a produzir a realidade descoberta. O trabalho de arte é concebido como fruto de relações entre espaço, tempo, luz e campo de visão do observador.
Nos três casos, o trabalho artístico dirige-se à natureza, transformando o entorno, com o qual se relaciona intimamente. As obras, de grandes dimensões, resistem à observação distanciada, a não ser por meio de fotografias e filmes. Para experimentá-las, é preciso que o sujeito se coloque dentro delas, percorrendo os caminhos e passagens que projetam. Ancorados num tempo e espaço precisos, os trabalhos rejeitam a sedução do observador ou as sugestões metafóricas. Põem ênfase na percepção, pensada como experiência ou atividade que ajuda a produzir a realidade descoberta. O trabalho de arte é concebido como fruto de relações entre espaço, tempo, luz e campo de visão do observador.
A earthwork tem origem numa vertente do chamado minimalismo dos anos 1960 a qual se filiam Carl Andre, Dan Flavin e Robert Morris. Referida a uma tradição que remonta aos ready-made de Marcel Duchamp e às esculturas de Constantin Brancusi, que testam explicitamente os limites da arte, essa linhagem da minimal art coloca em xeque as distinções arte/não arte, denunciando o sistema institucional de validação dos objetos artísticos. A recusa da rede alimentada por museus, galerias, colecionadores e outros, se explicita na defesa da indissociação arte/natureza/realidade e na realização de trabalhos que não são feitos para vender, que não podem ser colecionados. O homem está distante da exuberância do expressionismo abstrato, ainda bastante ligado às matrizes modernistas européias e aos efeitos imediatos do pós-guerra. Os anos 1960 trazem a pujança da sociedade industrial de massa, recuperada dos efeitos da Segunda Guerra Mundial, 1939-1945, os movimentos de contracultura, e a força política e econômica dos Estados Unidos a alimentar novos conflitos, como a Guerra do Vietnã, 1959-1975.
A orientação crítica dos trabalhos, no caso da earthwork, dirige-se ao mundo da arte, ao mercado e à rede institucional. Contra o espaço anódino das galerias, os artistas reclamam o espaço real, que traz consigo uma consciência geológica do tempo, tempo dos movimentos naturais, de corrosões e sedimentações. Diante de parte dessas obras - como as de Heizer e Smithson -, difícil não evocar os monumentos pré-históricos e a arqueologia de civilizações antigas. Marca mais decisivamente tecnológica aparece em De Maria, no citado The Lightning Field, em que a ideia de campo de forças e grade magnética combina-se à de evento natural - os raios e trovões -, na medida em que os pára-raios parecem nascer e crescer diretamente do solo.
Artistas europeus, como Richard Long e Christo, dialogam com certo espírito da earthwork, de modos diversos. Nos trabalhos de Long, por exemplo, as monumentais construções norte-americanas dão lugar a intervenções na natureza com dimensões humanas: as obras acompanham os passos e o olhar do caminhante. Em Christo, por sua vez, novas soluções arquitetônicas são obtidas pelo empacotamento de monumentos célebres, como o da Pont Neuf, em Paris, 1985, ou pela ação sobre a natureza como em Valley Curtain, 1972. O mesmo espírito de crítica ao mundo da arte, pela realização de "objetos" incompatíveis com o mercado, pela transformação do contexto, pela ênfase na interação com o público por meio de construções de outro tipo.No Brasil, não é possível falar em earthwork nos termos anteriormente definidos, mas talvez seja possível pensar em alguns desdobramentos, já muito afastados do sentido original da earthwork, é verdade, em experiências como a do Projeto Fronteiras, desenvolvido pelo Itaú Cultural em 1999. Nove artistas - Angelo Venosa, Artur Barrio, Carlos Fajardo, Carmela Gross, Eliane Prolik, José Resende, Nelson Felix, Nuno Ramos e Waltercio Caldas - são convidados a realizar intervenções em diferentes lugares das fronteiras do Brasil com países do Mercosul. É possível mencionar ainda alguns trabalhos de Marcello Nitsche e de Nuno Ramos - Matacão, 1996 por exemplo, que parecem guardar alguma relação com os projetos da arte da terra.
REFERÊNCIAS
BAKER, Kenneth. Minimalism.
Nova York: Abbeville Press, 1988.
FINEBERG, Jonathan. Art since
1940: strategies of being. London: Laurence King, 1995. 496p.: il.
KRAUSS, Rosalind E. Passages in
modern sculpture. Cambridge, Mass.: MIT Press, 1983. 308 p. : ill.
RAMOS, Nuno. Nuno Ramos.
Apresentação Helena Severo, Vanda Mangia Klabin, Tadeu Chiarelli; curadoria e
texto Alberto Tassinari, Rodrigo Naves. Rio de Janeiro: Centro de Arte Hélio
Oiticica, 1999.
Nenhum comentário:
Postar um comentário