sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

Bauhaus

"Criemos uma nova guilda de artesãos, sem as distinções de classe que erguem uma barreira de arrogância entre o artista e o artesão", declara o arquiteto germânico Walter Adolf Gropius (1883 - 1969), quando inaugura a Bauhaus, em 1919. Criada com a fusão da Academia de Belas Artes com a Escola de Artes Aplicadas de Weimar, Alemanha, a nova escola de artes aplicadas e arquitetura traz na origem um traço destacado de seu perfil: a tentativa de articulação entre arte e artesanato. Ao ideal do artista artesão defendido por Gropius soma-se a defesa da complementaridade das diferentes artes sob a égide do design e da arquitetura. O termo bauhaus - haus, "casa", bauen, "para construir" - permite flagrar o espírito que conduz o programa da escola: a idéia de que o aprendizado e o objetivo da arte ligam-se ao fazer artístico, o que evoca uma herança medieval de reintegração das artes e ofícios.
A proposta de Gropius para a Bauhaus deixa entrever a dimensão estética, social e política de seu projeto. Trata-se de formar novas gerações de artistas de acordo com um ideal de sociedade civilizada e democrática, em que não há hierarquias, mas somente funções complementares. O trabalho conjunto, na escola e na vida, possibilitaria não apenas o desenvolvimento das consciências criadoras e das habilidades manuais como também um contato efetivo com a sociedade urbano-industrial moderna e seus novos meios de produção. A ligação mais efetiva entre arte e indústria coincide com a mudança da escola para Dessau, em 1925. No complexo de edifícios projetados por Gropius são delineadas as abordagens características da Bauhaus: as pesquisas formais e as tendências construtivistas realizadas com o máximo de economia na utilização do solo e na construção; a atenção às características específicas dos diferentes materiais como madeira, vidro, metal e outros; a idéia de que a forma artística deriva de um método, ou problema, previamente definido o que leva à correspondência entre forma e função; e o recurso das novas tecnologias. Data desse período o desenvolvimento de uma série de objetos - mobiliário, tapeçaria, luminária etc. -, produzidos em larga escala, como as cadeiras e mesas de aço tubular criadas por Marcel Breuer (1902 - 1981) e Ludwig Mies van der Rohe (1886 - 1969) e produzidas pela Standard Möbel de Berlim e pela Thonet.
A Bauhaus atrai artistas de vanguarda de diversas nacionalidades, nem sempre afinados em termos de filiações teóricas, gerando a convivência de orientações estéticas díspares dentro da escola e redefinições no projeto ao longo de sua história. Do corpo docente fazem parte Johannes Itten (1888 - 1967), Theo van Doesburg (1883 - 1931), Wassily Kandinsky (1866 - 1914), Paul Klee (1879 - 1940), László Moholy-Nagy (1894 - 1946), Breuer, Hannes Meyer (1889 - 1954), Van der Rohe, Oskar Schlemmer (1888 - 1943), Joseph Albers (1888 - 1976) e outros. A diversidade dos colaboradores é responsável pelo contato direto da Bauhaus com diferentes tendências da arte européia: o construtivismo russo, o grupo de artistas holandeses ligados ao De Stijl [O Estilo] e os adeptos do movimento de pintura alemã Neue Sachlichkeit [Nova Objetividade].
O ano de 1928 marca a saída de Gropius da direção e sua substituição pelo arquiteto suíço Hannes Meyer, o que sinaliza uma ênfase mais social em relação ao design, traduzida na criação de um mobiliário de madeira - mais barato, simples e desmontável - e de grande variedade de papéis de parede. Diante das pressões do nazismo sobre Meyer, em 1930 a escola passa a ser dirigida pelo arquiteto Mies van der Rohe. Ela é oficialmente fechada em 1932 e, após uma tentativa frustrada de recomposição em Berlim, encerra suas atividades, por determinação dos nazistas, em 1933. A emigração dos professores da escola é fator decisivo na difusão das idéias da Bauhaus pelo mundo todo. Nos Estados Unidos, para onde se dirige boa parte deles - Gropius, Moholy-Nagy, Breuer, Bayer, Van der Rohe e outros - surge a Nova Bauhaus, em Chicago, 1937/1938 e o Architectes's Collaborative - TAC, escritório de arquitetura criado por Gropius em 1945, quando é professor em Harvard.
Ainda está por ser feito um rastreamento sistemático das influências da Bauhaus no Brasil. Indicações esparsas permitem aferir referências ao programa da escola na década de 1930. Por exemplo, no 1º Salão de Arquitetura Tropical, 1933, no Rio de Janeiro, em cujo catálogo é reproduzido um texto de Gropius, e que tem como desdobramento mais imediato o lançamento da revista Base, editada por Alexandre Altberg (1908), segundo algumas fontes, ex-aluno da Bauhaus. E, nessa mesma década, os debates sobre arquitetura popular, veiculados na revista Arquitetura e Urbanismo, mencionam freqüentemente os projetos coletivos da escola. A literatura faz menção ainda à experiência de remodelação urbana empreendida por Luiz Nunes (1909 - 1937), no Recife, à frente da Diretoria de Arquitetura e Urbanismo, também nos anos 1930, como inspirada na Bauhaus. Os projetos do Instituto de Arte Contemporânea - IAC do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand - Masp, 1951, e o da Escola Superior de Desenho Industrial - Esdi, do Rio de Janeiro, 1963, inspiram-se, cada qual a seu modo, no programa educativo da escola de Gropius. No campo das artes plásticas, é possível pensar no impacto das obras de Max Bill (1908 - 1994), na década de 1950, por meio das quais certos princípios da Bauhaus atingem o concretismo brasileiro.

REFERÊNCIAS
ARGAN, Giulio Carlo. Arte moderna: do iluminismo aos movimentos contemporâneos. Tradução Denise Bottmann, Frederico Carotti. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
CARMEL-ARTHUR, Judith. Bauhaus. Tradução Luciano Machado. São Paulo: Cosac & Naif, 2001. 80p., il.
CHILVERS, Ian (org.). Dicionário Oxford de arte. Tradução Marcelo Brandão Cipolla. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
DICIONÁRIO da Pintura Moderna. Tradução Jacy Monteiro. São Paulo: Hemus, 1981. 380 p., il. p.b.
FRAMPTON, Kenneth. História crítica da arquitetura moderna. São Paulo: Martins Fontes, 2000. 482p.
GROPIUS, Walther. Bauhaus: novarquitetura. 6.ed. São Paulo: Perspectiva, 2001. 220p.(Coleção Debates)
La Nuova enciclopedia dell'arte Garzanti. Milano: Garzanti, 1986. 1117 p.: il. 
MORAIS, Frederico. Cronologia das artes plásticas no Rio de Janeiro: da Missão Artística Francesa à Geração 90 : 1816-1994. Rio de Janeiro: Topbooks, 1995.
ZANINI, Walter (Coord.). História geral da arte no Brasil. São Paulo: Instituto Moreira Salles: Fundação Djalma Guimarães, 1983. v.2.
BAUHAUS . In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2019. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo368/bauhaus>. Acesso em: 15 de Fev. 2019. Verbete da Enciclopédia.

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