A Revolução Francesa causou profundas transformações, não
apenas políticas, mas abalou todas as estruturas do pensamento espraiando sua
influência no campo das artes, da cultura e da filosofia, sob a forma de um
surto de liberalismo que se traduzia na defesa dos Direitos do Homem, da
democracia e da liberdade de expressão. Alterando a mentalidade européia e
modificando os seus critérios de valor. Assim a música e a arte de modo geral
procuravam se desligar da arte do passado deixando aos poucos os salões dos
palácios e pondo-se mais ao alcance da nova classe social em ascensão, a
burguesia, e invadindo as salas de concerto, conquistando um novo público ávido
de uma nova estética.
O movimento romântico constitui uma reação contra o
racionalismo e o classismo, opondo à universalidade dos clássicos o
individualismo e o subjetivismo
Enquanto no Classisismo havia uma grande preocupação pelo
equilíbrio entre a estrutura formal e a expressividade, no romantismo os
compositores buscavam uma maior liberdade da forma e uma expressão mais intensa
e vigorosa das emoções, freqüentemente revelando seus sentimentos mais
profundos, inclusive seus sofrimentos.
Além da forte expressividade outra característica marcante
no período musical romântico é a chamada música programática ou música
descritiva. Não que em outros momentos da história da música não houvesse esse
tipo de produção, mas no período romântico, essa é uma tendência bastante
acentuada. Neste aspecto, muits vezes, o romantismo literário se confunde com o
musical. Muitos compositores românticos eram ávidos leitores e tinham grande
interesse pelas outras artes, relacionando-se estreitamente com escritores e
pintores. Não raro uma composição romântica tinha como fonte de inspiração um
quadro visto ou um livro lido pelo compositor. Mas aqui mais uma vez a
necessidade de expressar, a música aliás, tem no romantismo a função essencial
de expressar, e a alma é o objeto que se deve primordialmente retratar. Muitas
das composições pintam quadros, contam histórias; o individualismo romântico
incitará freqüentemente o músico a “pintar” suas próprias experiências.
Entretanto, apesar do individualismo, da subjetividade e do desejo de expressar
emoções, o músico romântico ainda respeita a forma e muitas das regras de
composição herdadas do classismo.
O Romantismo surge sobre bases tonais sólidas, o período
romântico é o derradeiro momento da música tonal. Entre os traços comuns aos
compositores do período podemos ressaltar a maior liberdade de modulação e o
cromatismo cada vez mais progressivo que levou os músicos até a fronteira do
sistema tonal de Bach. E é esse cromatismo que vai garantir uma maior liberdade
e expressividade a essa música “individualista” e “subjetiva”. As formas
livres, lieds, prelúdios, rapsódias, o sinfonismo, o virtuosismo instrumental e
os movimentos nacionais incorporam elementos alheios à tonalidade estrita do
classicismo e esta lentamente se desfaz, até chegar à beira da atonalidade com
a música de Wagner (1813-1883).
Outro aspecto de destaque do período romântico está na
própria concepção de artista da época. A concepção do homem genial incita a
buscar na biografia do artista os sinais de um destino excepcional. Os reveses
da vida tendem a satisfazer a sanha do público, pois o artista genial é o
eterno sofredor, em volta do mito estão a pobreza, a humilhação, as desventuras
amorosas (Beethoven), a incompreensão dos contemporâneos, a doença (Beethoven)
ou a loucura (Berlioz e Schumann) contribuem para a admiração sobre o caráter
singular do artista. Na verdade os artistas românticos eram eles mesmos
bastante atentos à publicidade da sua imagem. Ou como diria Flaubert “O artista
deve dar um jeito para fazer a posteridade acreditar que ele não viveu”.
O músico romântico procurou se firmar como um artista
autônomo, deixando de se submeter a patronos ricos, como ocorria no período
barroco e clássico. Isso evidentemente garantia uma maior liberdade de criação
aos músicos.
Durante o Romantismo houve um rico florescimento da canção,
principalmente do lied (‘canção’ em alemão) para piano e canto. O primeiro
grande compositor de lieder (plural de lied) foi Schubert (1797-1828). Essa
forma é também desenvolvida mais tarde por Robert Schumann (1810-1856) e mais
posteriormente por Johannes Brahms (1833-1897). Inicialmente os textos são
retirados da poesia romântica alemã de Goethe (1749-1832) e Heine (1799-1856).
Também são características da época as formas livres como os prelúdios,
rapsódias, noturnos, estudos, improvisos etc., presentes na obra de Frederic
Chopin (1810-1849) e Franz Liszt. Essas peças são geralmente para piano solo e
realçam o virtuosismo instrumental, dividindo a importância do concerto entre a
obra e a presença do intérprete.
A ópera
As óperas mais famosas hoje em dia são as românticas. Os
grandes compositores de óperas do Romantismo foram os italianos Verdi e Rossini
e na Alemanha, Wagner. No Brasil, destaca-se Antônio Carlos Gomes com suas
óperas O Guarani, Fosca, O Escravo, etc. A orquestra cresceu não só em tamanho,
mas como em abrangência. A seção dos metais ganhou maior importância. Na seção
das madeiras adicionou-se o flautim, o clarone, o corne inglês e o
contrafagote. Os instrumentos de percussão ficaram mais variados.
O concerto romântico usava grandes orquestras; e os
compositores, agora sob o desafio da habilidade técnica dos virtuosos, tornavam
a parte do solo cada vez mais difíceis. Compreende obras para grandes
orquestras e privilegia o virtuosismo. Destaca-se a obra de Johannes Brahms,
com suas quatro sinfonias, dos franceses César Franc (1822-1890) e Hector
Berlioz (1803-1869), que revoluciona a concepção da orquestra clássica ao
acrescentar mais instrumentos em sua Sinfonia fantástica, op.14, de 1830,
reformulando os modos de instrumentação vigentes em sua época.
Outro aspecto de destaque no período romântico é o
nacionalismo. A música do final do século XIX, embora imbuída do
individualismo, reflete as preocupações coletivas relacionadas aos movimentos
de unificação que marcam a Europa. Até a metade do século XIX, toda a música
fora dominada pelas influências alemãs. Foi quando compositores de outros
países, principalmente os russos, passaram a ter a necessidade de criar a sua
música, enaltecendo as suas raízes e a sua pátria. Inspiravam-se em ritmos,
danças, canções, lendas e harmonias folclóricas de seus países. É o chamado
Nacionalismo Musical. Músicos como Bedrich Smetana (1824-1884) e Antonin Dvorák
(1841-1904), Edvard Grieg (1843-1907), Modest Musorgsky (1839-1881) e Pyotr
Ilyich Tchaikovsky (1840-1893) empregaram com freqüência temas nacionalistas em
suas óperas, enquanto suas obras sinfônicas adquiriam intensidade e identidade
própria ao combinar coloridos nacionalistas com os procedimentos estruturais
estabelecidos pela corrente principal alemã.
A imagem que temos hoje da chamada música erudita é
notadamente romântica. Não é à toa portanto, que nas salas de concerto, o piano
seja visto como instrumento de destaque, ao lado do violino, que também ganhou
fama como instrumento solo e orquestral. No século XIX o piano passou por
diversos melhoramentos. Quase todos os compositores românticos escreveram para
este instrumento, os mais importantes foram: Schubert, Mendelssohn, Chopin,
Schumann, Liszt e Brahms. Embora em meio às obras destes compositores se
encontrem sonatas, a preferência era para peças curtas e de forma mais livre.
Havia uma grande variedade, entre elas, as danças como as valsas, as polonaises
e as mazurcas, peças breves como o romance, a canção sem palavras, o prelúdio,
o noturno, a balada e o improviso. Outro tipo de composição foi o étude
(Estudo), cujo objetivo era o aprimoramento técnico do instrumentista (aqui
destaca-se mais uma vez os “estudos para piano”).
Com efeito, durante esta época houve um grande avanço nesse
sentido, favorecendo a figura do virtuose: músico de concerto, dotado de uma
extraordinária técnica. Virtuoses como o violinista Paganini e o pianista Liszt
eram admirados por platéias assombradas.
O século XIX apresenta um novo público formado pela classe
social burguesa que se interessa pela arte intimista: obras para solista,
música de câmara e representações vocais, com acompanhamento instrumental, e a
poesia de diferentes países. O canto acompanhado quer com cravo, piano ou guitarra,
possui as qualidades específicas nacionais, as que encontramos no lied alemão,
na mélodie francesa ou na canção espanhola ou inglesa. Ainda que antigo na
forma, e talvez até por isso, é imediata a identificação do público graças aos
temas que essas canções “românticas”, evocam, tão próximas aos anseios do homem
burguês. Como foi definido por Heinrich Heine, o lied é o “coração que canta, o
peito que se agita”. A canção é a expressão musical de um “estado de espírito”,
impõe a primazia da paixão e dos sentimentos sobre a razão, junto a idéia de
liberdade e exaltação da natureza. Entre os lieder mais famosos estão
evidentemente os de Schubert, a exemplo de “Nacht und Träume”, considerado um
dos mais belos do autor. Schubert fez cerca de seiscentos e cinqüenta leader,
nas formas mais diversas, desde a simples canção estrófica até a cena dramática
ou a cantata.
No que se refere à música coral, as mais importantes
realizações dos compositores românticos estão na forma do oratório e do réquiem
(missa fúnebre). Dentre os mais belos oratórios se incluem o “Elias”, de
Mendelssohn (1809-1847), composto nos moldes de Haendel; “L´Enfance du Christ”
(A infância de Cristo) de Berlioz (1803-1869); e “The Dream of Gerontius” (O
sonho de Gerôncio) de Elgar (1857-1934), que em vez de se basear em algum texto
bíblico, constitui o arranjo de um poema religioso.
Certas Missas de Réquiem são importantísssimas e algumas
mais apropriadas para serem apresentadas em casas de concerto do que em uma
igreja. O réquiem de Berlioz por exemplo, exige uma imensa orquestra com oito
pares de tímpanos e quatro grupos extras de metais, posicionadosnos quatro
cantos do coro e da orquestra. O Réquiem de Verdi embora de estilo dramático, é
sincero em seu sentimento religioso. Em nítido contrastre com estas obras de
caráter grandiloqüente está o calmo e sereno réquiem do compositor francês
Gabriel Fauré (1845-1924). Não podemos deixar de citar o réquiem de Brahms,
considerado por alguns como a mais bela obra coral do romantismo, composto por
ocasião da morte de sua mãe. Para essa obra, em vez de musicar o usual texto
latino, Brahms (1833-1897) selecionou passagens significativas da Bíblia.
Ainda no que se refere ao canto não se pode falar sobre
romantismo sem citar a importância da ópera, é na verdade nessa forma musical
ampla e complexa, que une o canto e a interpretação, musica e teatro que está o
verdadeiro destaque da musical vocal no período.
Surge uma nova ópera italiana em que às artes do bel canto
somam-se um forte elemento histriônico: os cantores também têm que emocionar ou
divertir o público com artes de ator. O enredo acaba crescendo em importância.
A grande ária ainda é o ingrediente essencial, mas como centro da cena
dramática. Essa nova importância do elemento teatral é a contrribuição italiana
à ópera romântica. Destacam-se autores como Rossini (1792-1868), Bellini
(1801-1835) e Donizette (1797-1848). Outras mudanças significativas: os adornos
não podem ficar à decisão do intérprete que tende a abusar deles (o que era
comum no barroco); todos devem figurar na partitura porque o brilhantismo das
vozes não será desde essa altura o único interesse das representações; a missão
da orquestra vai além de simples acompanhamento das vozes, tendo um papel
bastante relevante.
A primeira reação à música lírica italiana partiu de Weber
(1786-1826) que deu características germânicas à opera inspirando-se na época
medieval e na mitologia alemã. A forma vocal oscila entre o canto propriamente
dito e o Singspiel, alternando o diálogo falado com árias. Entretanto é
inovador por introduzir na ópera a essência musical popular alemã. Seu herdeiro
seria Richard Wagner (1813-1883), que em busca de uma “obra de arte integral”,
criou o Drama Musical. Este reunia a pintura, a poesia e a arquitetura, além da
música. Mas, não contente com o drama isolado Wagner compôs uma tetralogia
(conjunto de quatro dramas). As suas experiências no canto tonal deram a obra
wagneriana uma tal originalidade que criou para os demais compositores
românticos um dilema, ou uniam-se à Wagner ou lutavam contra ele. A estrutura
do cromatismo wagneriano e a figura do leit motiv levavam a música para a beira
da atonalidade, era na realidade um caminho difícil de ser seguido, um caminho
sem volta. A renovação na ópera completou-se com a idéia wagneriana de
estrutura continua da ação, de maneira que o conjunto não seja dividido apenas
por uma sucessão de árias, interlúdios, coros, duos, etc., que surgem como
conseqüência da ação dramática, mas que não devem partir a obra em seções
prejudicando a idéia geral de unidade. Wagner é quem leva a termo essa idéia
que será acolhida não só pelos compositores de língua alemã, mas também pelo
italiano Giuseppe Verdi (1813-1901), um dos maiores autores de óperas do
período romântico, que criou as célebres “Nabuco”, “Aida”., “Rigolleto” e
tantas outras que saíram da pena do prolixo e popular compositor, que
celebizou-se em pouco tempo estendendo a sua influência a românticos de todo o
mundo, incluindo Carlos Gomes (1836-1896)
Na França aporta a estrutura da grande ópera que já havia
estado presente na tradição espetacular da ópera-ballet de Lully. A mesma
variedade musical do lied romântico manifesta-se também na ópera, na
complexidade dos arranjos orquestrais e na dificuldade do traçado das linhas
melódicas. Destacam-se os óperas de Meyerbeer (1791-1901) e a leveza da opereta
cômica de Offenbach (1919-1880) mais próxima do music hall.
BIBLIOGRAFIA
CANDÉ, Roland. História Universal da Música. São Paulo:
Martins Fontes, 1994
CARPEAUX, Oto Maria. O Livro de Ouro da História da Música:
da Idade Média ao Século XX.
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