terça-feira, 20 de agosto de 2019

ARTE CINÉTICA


O termo cinético está etimologicamente ligado à idéia de movimento. Na tradição artística, é possível localizá-lo, por exemplo, no Manifesto Realista de Antoine Pevsner (1886-1962) e Naum Gabo (1890-1977), em escritos de László Moholy-Nagy (1895-1946) e nas páginas da revista de arte argentina Madí (1946), ainda que saibamos ser a preocupação com o movimento nas artes visuais muito mais antiga, remontando, no limite, aos animais representados nas paredes de Lascaux. Se isso é verdade, o termo é efetivamente incorporado ao vocabulário artístico em 1955, por ocasião da exposição Le Mouvement [O Movimento], na galeria parisiense Denise René, com obras de artistas de diferentes gerações: Marcel Duchamp (1887-1968), Alexander Calder (1898-1976), Vasarely (1908), Jesus Raphael Soto (1923) Yaacov Agam (1928), Jean Tinguely (1925), Pol Bury (1922), entre outros. A especificidade da arte cinética, dizem os estudiosos, é que nela o movimento constitui o princípio de estruturação. O cinetismo rompe assim com a condição estática da pintura, apresentando a obra como um objeto móvel, que não apenas traduz ou representa o movimento, mas está em movimento. É o caso dos famosos móbiles de Calder, cujo movimento independe da posição e do olhar do observador. Construídos com peças de metal pintadas, suspensas por fios de arame, os móbiles movem-se ao sabor da aragem mais suave, produzindo efeitos mutáveis em função da luz. Ao observador cabe contemplar o movimento inscrito nas obras, "desenhos quadridimensionais", como quer Calder. As máquinas e motores construídos por Tinguely (por exemplo, Homenagem a Nova York: obra de arte que se autoconstrói e se autodestrói, 1960), assim como as esculturas cibernéticas de Nicholas Schöffer (1912) - a primeira data de 1956 - representam outros exemplos de trabalhos que implicam movimento real.

Críticos como Frank Popper (Naissance de l'Art Cinétique, 1967) tendem a alargar o sentido do termo abrigando em seu interior conjuntos muito diversos de trabalhos: não apenas os que lidam com o movimento real, mas também aqueles que implicam em movimento ótico. A partir desse sentido ampliado, pode-se pensar na op art como parte da arte cinética. Afinal, replica Victor Vasarely (1908), "o movimento ótico, ainda que ilusório, não pertence por acaso ao cinetismo?" Além da Galeria Denise René, que reúne um grupo de artistas envolvido com as investigações visuais da op art - Julio Le Parc (1928), Luis Tomasello (1935), Carlos Cruz-Diez (1923) etc. -, o Groupe de Recherche d'Art Visuel (GRAV) é outro pólo aglutinador da produção da op art e da arte cinética, em Paris, entre 1960 e 1968. Nele se destaca o nome do venezuelano Jesús-Raphael Soto. Entre 1950 e 1953, o artista cria obras em que elementos dispostos em série no espaço produzem efeitos de movimento virtual e vibração ótica (Estudo Para Uma Série, 1953). Mas é em 1955 que ele se lança mais diretamente em relação às pesquisas cinéticas, fundamentadas nas alterações perceptivas decorrentes seja da posição do observador diante da obra, seja do uso de elementos suspensos a vibrar diante um fundo. Os nomes de Karl Gerstner (1930), Almir Mavignier (1925), Jeffrey Steele (1931), Gehrard von Graevenitz (1934) e Larry Pons (1937) aparecem ligados à arte ótica e cinética.

Alguns estudos, como o do crítico inglês Guy Brett, ampliam ainda mais a noção de arte cinética, pensando-a como ligada à "linguagem do movimento". Com isso incorporam a ela trabalhos que evidenciam possibilidades de transformação, seja pela posição do observador, seja pela manipulação da obra. Os relevos justapostos que compõem Meodia (1957), de Agam, por exemplo, apresentam figuras distintas em função do deslocamento do observador. A obra, diz o artista, não está acabada, mas é gestada em cada momento. A idéia de metamorfose acompanha também os trabalhos de Soto (Metamorfoses, 1954 e Modulação em Azul, 1965) e os de Le Parc (Anteojos Para Una Visión Distinta, 1965). As ambiências luminosas de Dan Flavin (1933), por sua vez, figuram entre as pesquisas com movimento a partir do uso da luz fluorescente. Brett inclui o movimento ótico dos relevos de Sérgio de Camargo (1930-1990), as transformações dos bichos manipuláveis de Lygia Clark (1920-1988) e a "fragilidade e energia" das droguinhas de Mira Schendel (1919-1988) como parte da arte cinética, já que exemplares da "linguagem do movimento" tal como utilizada na arte contemporânea.

Experiências com o cinetismo e o movimento aproximam artistas e grupos em diversas partes do mundo, por exemplo, na Itália (Grupo T, de Milão, 1959-1964 e Grupo N, de Pádua, 1960), na Alemanha (Grupo Zero, 1958) e nos Estados Unidos, que têm na exposição The Responsive Eye [O Olhar Interativo], MoMA/Nova York, 1965, um marco da arte ótica e cinética. No Brasil, além dos nomes já mencionados, é possível pensar em alguns artistas que realizaram experiências óticas em seus trabalhos: Lothar Charoux (1912-1987), Almir Mavignier, Ivan Serpa (1923-1973), Abraham Palatnik (1928), entre outros. Nos anos 1950 algumas pinturas de Luiz Sacilotto (1924-2003) antecipam questões que serão desenvolvidas posteriormente pela op art propriamente dita. Trabalhos de Soto estiveram presentes na 7ª Bienal Internacional de São Paulo, 1963. Da 8ª Bienal, em 1965, participaram Vasarely e Tinguely. Mas é na 9ª Bienal, em 1967, que a arte cinética ganha destaque com a premiação de Julio Le Parc.

Arte cinética brasileiraNo Brasil, podemos citar, dentre outros artistas, as obras de Abraham Palatnik. Considerado um dos pioneiros da arte cinética, nasceu em 1928, em Natal (RN).Pintor e desenhista, Palatnik mudou-se com a família, em 1932, para Israel, onde estudou, entre 1942 e 1945, na Escola Técnica Montefiori, em Tel-Aviv, especializando-se em motores de explosão. Também estudou arte nos ateliês de Haaron Avni e de Sternshus, e no Instituto Municipal de Arte de Tel-Aviv. Retornou ao Brasil em 1948, instalando-se no Rio de Janeiro, onde conviveu com os artistas Ivan Serpa e Renina Katz, e com o crítico de arte Mário Pedrosa.O contato com os artistas e as discussões conceitua.

Um dos fundadores da arte cinética no país, o artista plástico Maurício Salgueiro, hoje com 85 anos, apresenta um recorte de sua série “Urbis”, no Palácio Gustavo Capanema. A exposição “Maurício Salgueiro 40 anos de Urbis” revela, além de uma retrospectiva, três obras inéditas. Até 5 de dezembro, o público poderá apreciar trabalhos que misturam tecnologia e arte.

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